Opinião

O Dilema do Dilema das Redes: o impactante documentário da Netflix

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O primeiro Dilema das Redes é se devemos ou não ter entretenimento em troca de nossos dados. Mas será esse o único dilema que vivemos com as redes sociais? 

Aparentemente não há sequer um brasileiro que não tenha assistido a um dos documentários mais importantes de 2020 produzidos pela Netflix: O Dilema das Redes (Social Dilemma, no título original).

A mim, porém, surpreendeu o número de pessoas que usava as redes sociais (e demais ferramentas da Internet) com tamanha inocência, imaginando que tantos serviços, assim, disponíveis sem um preço financeiro a ser pago, eram, de fato, gratuitos.

Espantei-me ao ouvir de pessoas próximas (e muito esclarecidas!), que pouco sabiam, ou nem sequer faziam ideia, de que sempre houve um preço. 

Muita gente já escreveu e comentou sobre o Dilema das Redes, e há um número abundante de conteúdos à disposição que tratam do assunto. Sendo assim, não vou me deter às questões políticas, partidárias, ideológicas e de teoria da conspiração, temas que embasam a maioria dos artigos. Mas falar do que, de fato, nos interessa na Hora do Empreendedor.

Dilema do documentário

Do grego, dilema tem o significado de escolha entre duas alternativas difíceis e contraditórias. Dilema é, portanto, o ato de escolher necessariamente entre duas opções contrárias e até mesmo insatisfatórias. 

Se observarmos o documentário do diretor norte-americano Jeff Orlowski (36) pela perspectiva do entretenimento x dados pessoais, temos o primeiro dilema a ser resolvido. Cabe ao usuário (fazendo referência ao termo que a produção faz questão de lembrar que pertence à clientes de redes sociais e de drogas ilícitas), cabe, portanto, a quem usa as redes sociais decidir se vai ou não disponibilizar seus dados pessoais para criar uma conta e ingressar na plataforma. Aí está o primeiro dilema.

Assista ao trailer: https://www.youtube.com/watch?v=7X54fS0SQyw

Sim, o primeiro. Talvez o espectador tenha imaginado que era apenas um o dilema: diversão e entretenimento em troca dos meus dados pessoais. Mas não se trata unicamente disso. Se assim fosse, a resposta seria mais fácil pra muita gente, e talvez nem fosse um dilema: vou me divertir com outra coisa, e proteger meus dados, o que de fato ocorreu com milhares de pessoas que excluíram seus perfis e contas nas redes sociais e, ironicamente, aproveitaram as próprias plataformas para criticar o uso dos dados pelas empresas.

Dilemas mais significativos

Os dilemas mais significativos, porém, não estão na esfera da diversão e do entretenimento. 

Ao fazer parte de uma rede social, o usuário está compartilhando seus dados e muitas informações pessoais, como: que lugares frequentam, quais comidas preferem, que tipos de livros lê, quais os filmes e seriados favoritos, qual o tamanho do calçado que usam, ou ainda que remédios costumam comprar e quanto gastam na farmácia. Definitivamente, os dados são o novo petróleo.

E as empresas que estão na internet, anunciando ou vendendo produtos e serviços, nem sempre conseguem garantir a proteção dessas informações aos usuários, tanto que já foram noticiados diversos casos de vazamento de dados ao redor do mundo, sendo o mais emblemático deles o do facebook, ocorrido em 2016, e que afetou mais de 50 milhões de contas da maior rede social do planeta.

Há outras formas de se divertir fora das redes sociais e do ambiente virtual, mas num mundo cada vez mais conectado e globalizado, onde o consumo online está cada dia mais elevado, é quase impossível imaginar um dia sequer sem internet e conexão.

Compras efetuadas pelo cartão de crédito, endereço residencial, nome e sobrenome de parentes, está tudo circulando pela rede, num frenesi interminável, com empresas e mais empresas tentando vender um novo produto ou serviço todos os dias.

Logo mais, vamos abordar essas questões à luz da LGPD, a Lei Geral de Proteção de Dados. Antes, porém, é importante ressaltar que há questões extremamente importantes, e que devem ser levadas em consideração, evitando reduzir a discussão às esferas da diversão e do entretenimento.

Com o planeta em constante evolução e a humanidade em desenvolvimento, e mesmo assim ainda combatendo antigos problemas, como fome, miséria, desemprego, acesso à saúde, mudanças climáticas, acessibilidade, educação e informação democratizadas, não podemos achar que o único dilema é se vamos nos divertir de posse de nossos smartphones em troca de informações pessoais ou não. 

Há problemas mais urgentes que esses a serem resolvidos, e é justamente uma boa base de dados que pode ajudar a humanidade a encontrar as respostas.

Esses mesmos dados que compartilhamos, podem contribuir com a medicina para encontrar a cura para doenças raras e até hoje insolúveis. Quando utilizados por empresas de maneira correta e consciente, os dados podem ainda ajudar a pré-diagnosticar pacientes que podem sofrer com alguma doença no futuro, e iniciar o tratamento preventivo.

Ainda falando de saúde, a engenharia genética, manipulação genética ou ainda Biohacking, pode aumentar o desempenho do corpo humano a níveis sobrenaturais, além de salvar vidas e alterar futuros, e só é possível a partir de dados bem coletados e tratados.

Banco de dados já são usados em diversos países do mundo para solucionar crimes e delitos com maior agilidade e rapidez, e encontrar criminosos e foragidos da justiça, especialmente com recursos de identificação facial, por meio de Inteligência Artificial.

Base de dados impedem que milhares de pessoas sejam condenadas injustamente, e protege centenas de outros cidadãos de sentenças prisionais sem ao menos serem julgados.

As redes de 5G vão possibilitar a fluência do Blockchain no dia-a-dia das pessoas, trazendo maior segurança e confiabilidade, inclusive na transmissão de dados pessoais e financeiros. Integrada à IA, essa tecnologia pode ainda evitar casos de corrupção, desvio de dinheiro e recursos, criptografando os conteúdos enviados de uma ponta à outra. 

Tudo isso só é possível graças ao compartilhamento de dados.

Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD

Por isso também foi aprovada no Congresso Nacional a Lei 13.709/18, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor neste ano, e visa proteger os usuários quanto ao uso de seus dados por plataformas online, ecommerce e demais serviços virtuais.

Os dados são utilizados por empresas para construir perfis (pessoal, profissional, de consumo, de crédito), e, entre outras coisas, a LGDP fala sobre o consentimento do cidadão para que seus dados sejam tratados por empresas, apresentando também as exceções que cabem à essa regra.

Mas, como todo cuidado é pouco, cabe aos usuários a primeira investigação se aquele site, loja virtual ou rede social merece seus dados, ciente de que eles serão utilizados para fins comerciais.

O dilema das redes, portanto, não é se devemos ou não entregar nossos dados à empresas que estão na internet, já que a negativa, hoje, parece ser impossível. Mas sim, quais as empresas, instituições e sites merecem obter minhas informações, e o que farão com elas além de me oferecer a compra de alguma coisa. 

O que devemos desejar e pleitear, antes de tudo, é que nossos dados sejam, sim, protegidos, e quando forem disponibilizados (por nós mesmos), e compartilhados (por terceiros), que sejam mais em nosso favor e benefício que de outros.

Ibraim Gustavo é jornalista, escritor e educador, Pós-graduado em MKT e MBA em Comunicação e Mídia

Publicado às 6h11

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