A violência contra a mulher é uma endemia crônica em
nossa sociedade, abarcando um cotidiano de espancamentos, lesões, cárcere
privado, violência física, de caráter sexual e feminicídio. As políticas de
proteção à mulher devem ir além da ótica da moralidade, da crítica ou da defesa
da questão de gênero.
Nos últimos dois anos 2.695 mulheres foram mortas por
feminicídio no país, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. São três
mulheres mortas por dia, simplesmente por serem mulheres. Em 81,7% dos casos o
assassino é o companheiro ou ex-companheiro. Durante a pandemia, as ligações
sobre violência doméstica, para o 190 da Polícia Militar, aumentaram 4%, de
595.705 mil para 619.353 mil, enquanto as ligações sobre outros crimes caíram.
Dos 5,6 mil municípios brasileiros, apenas 427 têm
delegacias de defesa da mulher, ou 7% das nossas cidades. Isso em um país que
registra anualmente mais de 225 mil denúncias de violência doméstica. Nos últimos
20 anos, 75.280 mulheres morreram vítimas de violência no Brasil. Em mais de
dez anos de guerra, no Vietnã, os norte-americanos perderam 58 mil soldados.
Um relatório da ONU detectou em todo mundo, durante a
pandemia da Covid 19, uma outra pandemia, a da violência doméstica contra as
mulheres, chegando à conclusão de que principal problema a ser enfrentado é do
da subnotificação. São Paulo tem 134 delegacias da mulher para 645 municípios.
É o estado mais bem aparelhado na proteção à mulher, no Brasil. Mas, muito além das delegacias, existe em
praticamente todos os municípios paulistas um aparato de proteção aos direitos
da mulher, coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento Social.
Toda a mulher ameaçada, dentro ou fora do lar pode se
dirigir a um dos 1.183 Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) em
todas as regiões do Estado para relatar seu problema e obter acolhimento e
encaminhamento. O objetivo é prevenir situações de violência ou riscos antes
que estas aconteçam.
Quando a mulher já
sofreu a violência física, sexual, por negligência, maus tratos, e ameaças, o
atendimento se dá nas 312 unidades dos Centros de Referência Especializada da
Assistência Social (CREAS), que trabalham com a proteção e o encaminhamento das
vítimas de violências consumadas. Mais ainda, há 43 abrigos institucionais para
mulheres em situação de violência, em endereços sigilosos para recebê-las em
todo o Estado.
São as duas portas de entrada para todos os programas de
assistência social, mas que em São Paulo foram incorporadas na luta pelos
direitos da mulher, agindo preventivamente, ou abrigando mulheres ameaçadas em
espaços conveniados com municípios e ongs, em segurança, longe do agressor,
oferecendo condições para que elas possam reorganizar as suas vidas. A luta
contra a violação dos direitos da mulher não pode ser apenas um caso de
polícia. Precisa ser complementada por ações de caráter social. Além de
estancar a violência é preciso acolher, orientar encontrar alternativas para as
vítimas.
Estamos diante de um dilema civilizatório uma vez que a violência doméstica sempre foi uma das maiores violações dos direitos humanos. Há naturais portas abertas capazes de ouvir e dialogar com a população e, por isso mesmo, são agentes eficazes na notificação, conscientização, mediação de conflitos e no encaminhamento das vítimas. O feminicídio é uma doença social e como tal deve ser permanentemente tratada.
*Célia Leão é secretária estadual de Desenvolvimento
Social, advogada, e conta com mais de 30 anos no Poder Legislativo, como
vereadora de Campinas e mais sete mandatos consecutivos como deputada estadual
em São Paulo.
Publicado às 10h26
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